Ode à idiotia

Que o espelho cuide sempre de esconder a verdade
Que o espelho seja o meu Outro quando eu estiver só
Que eu nunca esteja só durante a novela das nove
Que o jornalismo sangre cada vez mais e diga cada vez menos
Que a gaveta tenha sempre analgésicos guardados
Que a enxaqueca de cada dia nos dai hoje nunca falte
Que a justiça de cega esmole na sarjeta algumas misericórdias
Que a ciência sentencie a razão do pão do pó e do pâncreas
Que a razão justifique a polícia
Que a fé não se realize senão por indução
Que os heróis tenham pelo menos trezentos anos de história
Que o medo seja sofrido em paz na propriedade privada
Que o amor não se esqueça de fazer as compras do mês
Que a liberdade mova uma ação jurídica nos tribunais
Que de carro se use cinto de segurança
Que o mundo deixe de ser redondo
Que os monstros não sejam feitos de aço
Que a favela anoiteça em paz
Que Antônio Conselheiro seja de uma vez por todas esquecido
Que o brasileiro não seja mais que aquele que vende pau brasil
Que a economia jamais seja considerada política
Que essas verdades que digo desdobradas se repitam à exaustão.

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