Aí, de repente, a vida revelou sua total falta de sentido,
que diferença faz, se chove ou não? E se estamos na chuva ou não? Se vem um carro que passa rápido numa poça e molha a gente com água empoçada? Que diferença faz?
Se alguém te diz coisas sobre você, que supostamente deveriam te deixar triste
e até talvez te fazer chorar, mas você simplesmente não sente nada diante disso.
E não sentir nada diante disso não é indiferença - é só um monte de nada preenchendo outros montes de nada.
É a real descoberta de que ninguém perde coisa alguma,
que todas as coisas e não coisas se pertencem e o máximo que você faz durante a vida
é se entregar pra que elas (as coisas e não coisas) te usem provisória e indefinidamente como um simples meio de estar no mundo. No imenso vazio do mundo.
Cada pessoa, não é mais que uma ponte pela qual transitam sentimentos raros e vulgares,
profundos e banais; onde passam corpos e tecidos e metais e fluidos e dores e decepções e crimes e mortes e no final é como no começo - é a ausência de durante, a falta de presente; o nada absoluto. Maior que o tempo.
Aí, de repente, você envelhece e quebra ossos e se esquece onde deixou as chaves de casa, se esquece do caminho de casa, se esquece do nome próprio e vira um mendigo sem nome, sem teto, sem alegria, sem tristeza; é atropelado um dia e morre sua última morte. Numa linha de trem ou na avenida central e que diferença faz? Se ninguém enxerga sua memória esmagada por tantos automóveis insensíveis, seu corpo assassinado cotidianamente nos corpos que se desdobram para além do próprio limite. Que diferença faz?
O amor já foi banido do mundo e o seu sorriso não está.