" Diz Petrónio que fora o medo que inventara as divindades. Deus é o que é. O homem é o pequeníssimo bicho da Terra, de que fala o Camões. Entre Deus e o homem, só a soberba estúpida do homem podia inventar convenções, concordatas, obrigações e alianças. O sagui é muito menos estúpido e mais modesto. Come, bebe, dá cabriolas, faz caretas ao mau tempo, coça-se ao sol, retouça-se à sombra, vive, e acaba feliz, porque se não receia de vir a ser homem. A estolidez do homem! Diz ele empapado de vaidade tola: 'Deus tem os olhos em mim!' Que importância! Deus tem os olhos nele! Se assim fosse, havia de ver bonitas coisas o criador do homem que mata seu irmão!
Os olhos nele, para quê? Para envergonhar-se a cada hora da sua obra!... É a blasfêmia em todo o seu asco! Rebalsa-te em sangue, miserável vampiro! Emperla os teus cabelos, meretriz, que deixas morrer tua mãe de fome! Mãe infame, come aí em toalhas de Flandres o preço da desonra de tua filha! Ostentai-vos, vermes, aos olhos de Deus, que estão pasmados em vós!..."
trecho do livro Coração, Cabeça e Estômago de Camilo Castelo Branco
Essa é a realidade humana e tudo quanto somos capazes. Nem só de belezas faz-se a vida e o poeta também é vil na sua estreita e torta vida que fica almejando um mundo infinito pela fresta de sentimentos confusos e indecisos, como se só a intesidade fosse plenamente verdadeira e consciente nisso tudo.
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